quarta-feira, setembro 29, 2004

DUAS PALAVRAS MÁGICAS

Para muitos é difícil pronunciar as palavras "Não sei.", mesmo quando elas se mostram como a melhor alternativa para a situação. É preciso sabedoria para dizê-las com serenidade e naturalidade. Como driblar o ego e se desnudar, mostrando-se ignorante? Vem aquele interior questionamento: "O que vão pensar de mim se eu não souber essa resposta?" Vamos observar algumas distintas situações.

No ambiente de trabalho: "Comigo as coisas são no grau: não tem nada que eu não saiba um pouco", pensa o sabichão. "Com que cara vou dizer ao chefe que não sei? Qual é? Se ele veio perguntar para mim é porque eu tenho condições de responder. Não vou queimar o meu filme".

E quando o caso envolve vínculos afetivos de primeiro grau? "O quê? Falar para o meu amor que não sei o que está me perguntando? Como fica o meu moral? Sou referência no pedaço". Tem ainda a situação daquela pessoa cuja filha querida lhe formula uma pergunta fora do seu campo de conhecimento: "Tenho que preservar a minha imagem de sabichão: afinal de contas, para ela eu sou o máximo, sou infalível".

Imagine o desconforto daquele indivíduo quando o amigo que lhe chama de "guru" lhe perguntar algo, trazendo, ainda, outro amigo dele, como testemunha, para presenciar uma demonstração da vasta erudição. Certamente, antes de emendar a pergunta, como sempre faz, ele dirá, eufórico e orgulhoso: "Quer ver? Ele nunca me deixou sem resposta: sabe tudo!". Qual a reação do "Enciclopédia" se não souber a resposta nesse caso?

Em entrevista para emprego, fazendo parte da banca examinadora, vi candidato que, para não dar o braço a torcer diante de uma pergunta que desconhece, franze a testa, diminui o ângulo de visão e fala de forma pausada, verbalizando abobrinhas que nada têm a ver com a formulação feita. Perdeu, então, qualquer chance de ser escolhido, ao ferir um elementar princípio ético: o da integridade.

Há muitas outras formas de alguém ser inconveniente, como aqueles que, na ânsia de honrarem o seu bordão "Sou curto e grosso", pecam pela grosseria, acrescentando outras palavras à frase-padrão "Não sei": "Não quero saber e tenho raiva de quem sabe".

De que forma se deve analisar o caso em que a pessoa se acostuma a ser "criativa" na hora de responder categoricamente sobre o que não sabe, como se exibisse pleno domínio sobre o assunto? Ela faz essa dissimulação com tanta competência, freqüência e naturalidade, que a máscara acaba colando em sua face para sempre: "convence-se", então, que realmente "sabe" tudo. Nesse caso a fantasia tomou posse da mente, passando, então, a acreditar que é a realidade.

Como se pode constatar, o repertório pode ser bem diferenciado: todos esses atores julgam imprescindível reagir e se comportar como o fizeram. Espera-se, entretanto, uma postura óbvia nessas situações, a mesma exigida daquele que está atuando como professor ou palestrante, ou seja, quando se desconhece o teor da resposta, deve-se dizer simplesmente: "Não sei. Vou pesquisar sobre o assunto e, tão logo tenha uma resposta, direi a você". Pode-se, também, trilhar um prudente caminho alternativo e dizer, quando for o caso: "Não tenho certeza: se fosse para arriscar, eu diria que a resposta é ...".

Tudo seria bem mais produtivo nas relações interpessoais se todos tivessem o compromisso da transparência. Quer situação mais natural do que não saber a resposta de algumas das perguntas que lhe são formuladas? Elas podem perfeitamente não pertencer ao seu campo de atuação ou de interesse. Mesmo pertencendo, você tem o direito de desconhecê-las.

Ainda há muito o que se estudar sobre o comportamento humano: o que exercitei aqui foi apenas levantar algumas hipóteses. Se me fosse perguntado, de forma categórica, exigindo fundamentação: "Por que as pessoas assumem essa postura inconseqüente com tanta freqüência?", a minha resposta poderia ser sintetizada em duas palavras: "Não sei".

L.A.C.

5 comentários:

Anônimo disse...

Bom dia!

Pefiro falar um "não sei" ou "não estou bem certa disso, mas vou me informar e dou um retorno.", do que proferir, como se diz no popular, uma "batatada" e virar lenda!

Seu blog é muito bom! Parabéns pelo trabalho.

Um grande abraço.

V.S.D

Anônimo disse...

Vou adotar mais essas duas palavrinhas (não sei)no meu vocabulário de forma mais determinada. Muito bom o texto!

Anônimo disse...

Realmente dizer "não sei" realmente não é nada fácil, realmente as vezes nos parece ser muito mais fácil tentarmos responder a uma pergunta que não sabemos a resposta do que dizer "não sei". O texto me permitiiu refletir muito sobre isso e espero poder saber fazer um melhor uso dessas palavras.

Igor F. Vieira

Anônimo disse...

Professor Lourival,

Foi muito bom ter sido seu aluno. É muito bom saber que ainda posso contar com suas sábias palavras, aqui, contidas nos textos deste Blog.

Um grande abraço

Luis A.S.P

Anônimo disse...

Nao sei é magico e desconcertante. Voce tem rezao quando diz que devemos assumir que nao sabemos tudo, mas as pessoas que estao a nossa volta (pricipalmente num a entrevista para emprego) nao querem ouvir isso.

Gilvani Constancio