quinta-feira, setembro 23, 2004

DESAFIOS OU LENDAS

Atualmente, muitos dos alunos universitários mostram-se imaturos e despreparados, inseridos que estão no mundo do banalizado, querendo tudo mastigado, num flagrante exercício da Lei do Menor Esforço: provas/avaliações fáceis, arquivos disponibilizados, textos traduzidos, cópias de capítulos de livro e de artigos técnicos, pouco rigor no controle de freqüência e generoso abono de faltas pelos mais fúteis motivos.

Esse contingente citado não quer estudar: só tirar nota boa. Não gosta de prestar atenção nas aulas, adorando embarcar num empreendimento Helmann´s: viaja na maionese com muita facilidade. Nem sempre está preocupado em aprender: está mais de olho no certificado, no diploma. Acostumado a ser pouco cobrado e instigado, exibe baixa criatividade, pouca postura crítica: repete modelos conhecidos, ficando ao nível da mediocridade.

Muitos dos pais desses alunos, por sua vez, na ânsia de proteger a cria, têm (mesmo que de forma inconsciente) a expectativa de que o Professor seja de tudo um pouco: psicólogo, amigo, conselheiro e mestre. Que o Professor obtenha com os alunos, em termos de educação, postura e respeito, o que eles, pais, não conseguiram, em termos de resultados, nesses anos todos de vida comum.

A propósito, qual o perfil do aluno de hoje? Sem dúvida alguma, na sua maioria, é multifuncional, virtual, plugado: vara parte da noite navegando e, por isso, muitas vezes chega dormindo nas aulas pela manhã. Pode saber sobre o mundo da tecnologia muito mais que o Professor e a Escola, juntos.

Pertence à geração do descartável: ele troca de interesses e prioridades com muita rapidez e facilidade, seja em temos de ídolos, vontades, hobbies. Não consegue prestar muita atenção a uma coisa só, por muito tempo. Desconhece o lúdico das brincadeiras simples: se o poder aquisitivo permite, em seu mundo é tudo high-tech.

O que dizer das instituições? Via de regra são feitos poucos investimentos nos Professores, em termos pedagógicos (metodologias, troca de experiências, ferramentas, tendências, multidisplinaridade). Nessa realidade, para conseguir resultados satisfatórios o Professor conta com seu afilado instinto e sua aguçada percepção. Complementa o seu aprendizado bancando o autodesenvolvimento.

A escola, entretanto, espera que o Professor consiga resultados satisfatórios, exibindo competência, desprendimento e boa vontade para trabalhar com a diversidade, em termos de perfis de aluno:
- o que sabe muito;
- o que muito pouco sabe (muitos desconhecem regras elementares de gramática);
- o que nem quer saber;
- o que é portador de deficiência (visual, auditiva, neurológica, etc.);
- o que tem vasta experiência e conhecimento;
- o que não sabe que curso quer;
- o que tem certeza que não quer o curso em que está matriculado;
- o que é muito imaturo ainda (até há pouco tempo era muito comum o aluno ingressar no curso superior , com dezesseis ou dezessete anos, através de liminar).

Muitas vezes os recursos disponíveis para o Professor são o giz, o quadro e a saliva (sem nos esquecermos que giz causa alergia e suja muito). Em certos casos a tecnologia disponível está num nível razoável de evolução, mas em quantidade insatisfatória. Quando a quantidade é satisfatória, acaba sendo subutilizada.

Nobres a missão e a responsabilidade do Professor: está em sala para compartilhar aprendizagens, resolver problemas, orientar carreiras, buscando caminhos e possibilidades para aqueles alunos que pouco sabem sobre o seu futuro (muitas vezes, por imaturidade), estimulando-os a resgatarem / construírem a confiança em si mesmos, para que possam produzir segundo suas vontades e potencialidades e se tornarem aquilo que podem ser.

L. A.C.

5 comentários:

Anônimo disse...

Lourival,

Acho que a questão abordada em seu texto é muito mais complexa do que parece, mereceria um livro e não apenas um texto. Se formos analisar bem, temos que verificar de onde surgiu este tipo de aluno e temos que tomar cuidado com extremismos.

O que eu quero dizer com isso: A geração de hoje dos jovens entre 18 e 22 anos foi criada por pais que tiveram educação rígida, muito rigida, na época da ditadura. Acredito seriamente que esses pais por sofrerem tanta repressão durante suas criações inverteram o modo de criar seus filhos, os educando de forma muito solta e sem limite (e a impressão que me passa é que a nova geração que vem por aí está vindo ainda pior). Acredito que o maior problema dos jovens universitários de hoje (e não me excluo deste grupo, apenas digo que não são todos assim, claro) é que pela criação que nos foi oferecida, fomos levados à posturas assim.

O que temos que tomar cuidado é que por uma maioria preguiçosa, a parte interessada da turma acaba saindo prejudicada. E essa parte é geralmente a parte que irá obter grandes sucessos na vida. Acredito que o professor tentando não "facilitar" a vida do aluno, não se preocupando com textos em outros idiomas (que por mais entendíveis não se comparam ao idioma natural do aluno) e arquivos disponibilizados evita que essa parte interessada obtenha um grau de conhecimento e capacidade acima do que obteria se tivesse que vencer todas essas dificuldades.

O que quero dizer é: As provas jamais devem ser fáceis, as cobranças jamais pequenas, mas as facilidades sempre oferecidas.

Pensando da forma que está exposta a ênfase da educação cai sobre os 95% dos desinteressados e alunos fracos (futuramente fracos profissionais) mas será que a maior preocupação não deveria ser com os 5%. Quem sabe assim exigiria que os 95% se mexessem e corressem atrás do prejuizo. E se não correrem é problema de quem?

Concordo com a maior parte de seu texto, apenas me preocupo com os exageros que possam ser assumidos e consequencias que seriam geradas.

Um abraço,
Vitor Eugenio.

Anônimo disse...

Querido Amigo e professor Lourival,
Vejo sua produção literária e tenho quase certeza que isso tem muito a ver com o que você tem visto em nossa turma de Ciências da Religião. Acho que tem sido um enorme desafio para você esse nosso pessoal. Concordo naturalmente contigo em quase tudo no seu texto. Mas gostei demais o que o Vitor Eugênio (não o conheço) escreveu. Nossa turma de forma bem específica está inserida dentro de um contexto extremante complexo. quando entrei a turma já estava um semestre à frente e ali já pude perceber que o problema básico residia na presunção religiosa. De lá para cá a coisa evoluiu para o bem (ainda bem) e já não está tão ruim quanto era. Mas há um histórico interessante sobre a formação do curso, as mudanças pelas quais passou e as inseguranças que estão em torno do reconhecimento de curso e outros fatores. Por isso concordo com o nosso amigo Vitor Eugênio que a coisa é bem mais complexa. O que tenho visto em cada novo semestre é que os novos professores sempre chegam motivados em nossa turma e saem completamente decepcionados. Quem sabe poderemos um dia discutir sobre isso com tempo e mais profundamente. Um forte abraço e parabéns mais uma vez pelo seu bom desempenho aqui no seu blogger.
Alcimar

Anônimo disse...

Ao ler o texto comecei a pensar no tipo de aluno com que tenho trabalhado. Costumo dizer a eles em tom de brincadeira que alguns deles gostariam que existisse um equipamento de "transferência automática do conhecimento", cuja implementação consistiria de um cabo conectando dois cérebros produzindo o maravilhoso efeito do "aprendizado sem esforço". É claro que uma boa parte pensa diferente.
Muito do seu texto reflete a realidade de uma sociedade que não conquistou as coisas, mas simplesmente as adquiriu prontas. Importamos o nosso "processo democrático", o sistema de ensino, as tecnologias (das mais banais às mais avançadas) e pior, os maus hábitos da cultura dominante. Este problema se reproduz igualmente na sala de aula: como não somos (como sociedade) produtores de conhecimento, o aluno não espera ver o conhecimento construído em sala, ele simplesmente o quer pronto, tal como os demais produtos encontrados no mercado.
Acho que o maior desafio do profissional do ensino é mostrar (na medida do possível) como ocorre a contrução do conhecimento na sua área de interesse (a disciplina lecionada).

Grande abraço,

Tiago W.

Anônimo disse...

Tenho 26 anos e vários conflitos com um irmão de 21 anos por causa do tema exposto: o fato de querer tudo pronto. Comecei a observar outras pessoas com esta idade e percebi que isto é um grande problema desta geração (entre 19 e 22 anos).

Conversando com amigos da mesma idade que eu, que já cursaram ou estão terminando a graduação, a maioria já sabia muito bem o que queria ao sair da colegial. E a faculdade era nossa última esperança de uma vida tranquila na fase adulta. Digo faculdade, no sentido de nos formar profissionais e não para nos dar um diploma. Com a "galera" mais nova (que geralmente são nossos irmãos, primos ou alunos), chega a ser irritante a falta de objetivos, as dúvidas e porque não dizer, a inércia diante da vida. Não sabem o que fazer, têm dúvidas do tipo: "não sei se vou fazer Odontologia, Ciência da Computação ou História" e parece que o conhecimento dura apenas um semestre.

O meu medo é o seguinte: que tipo de profissional vai sair desta geração? Tudo bem, o fenômeno não é unânime mas é algo a ser observado.

Concordo com o sr. Vitor Eugênio quando diz que "...geração de hoje dos jovens entre 18 e 22 anos foi criada por pais que tiveram educação rígida, muito rigida, na época da ditadura." E vou além: acho que muitos deles transferiram a toda a responsabilidade da educação para a escola, que transfere para o professor. E que na ânsia de "compensar" a educação rígida que tiveram, dão pronto o que na verdade deveria ser construído.

A questão é bastante complexa. Envolve a questão familiar, a trajetória dele até a faculdade, o processo de seleção, dentre outros fatores. Mas acho que deve começar a ser discutido por toda a sociedade, principalmente pelos profissionais da educação.

Saudações,

VSD

Anônimo disse...

Lourival,

Posso afirmar como aluno que existe uma separação informal nas salas de aula alguns querem tudo mastigado outros preferem aprender o caminho e que suas preocupações são compartilhadas com vários de nós, muito do que você escreveu já foi comentado com indignação pelos corredores e salas. Sempre que um professor "aperta" um pouco mais os alunos e cobra mais pesquisa e dedicação com o que chamo de "trabalhos que dão trabalho" eu fico muito satisfeito, acho legal quando alguns alunos dizem que o curso está difícil e penso que a instituição está no caminho certo. Também acredito que não adianta mostrar as respostas e sim o caminho para obtê-las pois quando estiverem no mercado este será o comportamento esperado.

No comentário anterior VSD diz "O meu medo é o seguinte: que tipo de profissional vai sair desta geração?", acredito que aqueles profissionais que aproveitaram ao máximo as oportunidades durante a graduação terão melhores oportunidades no mercado e ocuparão os melhores lugares, aqueles que perceberem que perderam tempo tentarão buscar o conhecimento que deixaram de adquirir no momento adequado e aqueles que mesmo assim não tiverem esta percepção acabarão sendo relegados a posições menos privilegiadas. Parabéns por estar fazendo sua parte e tentando abrir os olhos daqueles que ainda não perceberam que precisam construir hoje o que terão para oferecer como profissionais amanhã.

Adorei os textos do seu Blogger, envie um link do texto sobre 'rotina' para um amigo que tinha acabado de me confidenciar sua insatisfação com o trabalho por este motivo.

Apesar de estudar na FAESA ainda não fui seu aluno, você me conhece de vista e talvez tenha ouvido falar de mim por outros professores.

Domingos Paraiso